Grafiteiro

1 2 3 4 5 6 Goiabas podres deslizam mais devagar que embalagens de salgadinho Fofura, sabor churrasco. Os invólucros de petiscos, assim como os do sabonete Lux Luxo, perdem fácil para as garrafonas de refrigerante, como aquela de guaraná Kuat que vem escorregando pelas águas marrom-cinza-esverdeadas, se esgueirando entre panos quase desfeitos, retalhos de papelão, pedaços de plástico e outros objetos pastosos não-identificáveis. Numa quinta-feira qualquer de março, o córrego fétido empurra seus detritos podres na regata habitual que conduz ao rio Tietê, a 20 metros dali.

Zezão não está interessado. Ele já viu a correnteza levar sofás, dezenas de cachorros mortos, um vibrador, orelhões e o cadáver de um cavalo. “Arrasta os pés”, grita ele, para suplantar o ronco dos caminhões que passam na marginal, lá em cima, com palavras como Minuano, Riopardense ou Lusitana escritas nas suas carrocerias metálicas. Ele aponta meu par de galochas pretas, já marinadas de esgoto, e grita mais alto, com a voz grave e sotaque paulistano: “Arrasta os pés”. Zezão aprendeu por conta própria. Numa das suas primeiras visitas às galerias do Tietê, ele não arrastou os pés. Caminhou normalmente e descobriu que pregos enferrujados pelas águas do esgoto são inimigos piores do que baratas, ratos ou o cheiro do ralo. Ele não tinha nem galochas. Amarrava sacos plásticos de supermercado, quantos conseguisse, sobre as botinas de motoboy. “Dropava” em bueiros, em estações de tratamentos de esgoto, descia pirambeiras abandonadas, enfiava o corpo, sem proteção, nos dejetos. Águas passadas.

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